terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Anos de loucuras no Chelsea londrino

Seria preciso escrever mais alguns posts, para poder dar conta de tantos outros aspectos da vida daqueles malucos da Kings Road no Chelsea londrino. O escritor e ex "Junky people" William Burroughs, autor de Naked Lunch (Almoço Nu), o velho 'beat', que na época já passava de oitenta anos, sabia como lidar com eles, segundo disse numa conferência realizada no Ritzy Cinema em Brixton, mas não era fácil para os outros simples mortais. Entre eles havia gente muito torta e agressiva, alguns chegavam a ser assustadores, quando se aproximavam mais. Uma vez fiquei frente a frente por acaso com um sujeito com indumentária punk, respirei fundo para manter o autocontrole, mas me preparei psicologicamente para qualquer coisa, inclusive ser assaltado. O cara exibia algumas tatuagens bizarras e muitas cicatrizes, mas muitas mesmo, em seu rosto não havia mais espaço para nenhuma outra, haviam também no pescoço, faltava-lhe um pedaço da orelha, era assustador, mas após alguns breves segundos de profunda tensão, nossos olhares se dispersaram, e ninguém dirigiu a palavra para ninguém e nos afastamos, cada um seguiu seu rumo. Outros eram verdadeiros arruaceiros, quando estavam em grupo, formavam pequenas gangues de meia dúzia de encrenqueiros, e saíam por ali afora a procura de alguma vítima para qualquer coisa, sempre buscando divertimento. Espancar alguém era divertimento. Numa ocasião fiquei impedido de sentar-me num banco de uma pequena praça da localidade, porque um pequeno grupo de punks percebendo a minha intenção de sentar, anteciparam-se e lambuzaram o banco todo com ovos. Cheguei a ouvir testemunho de gente a contar no metrô, que havia sido assaltada por punks. É curioso, porque o escritor inglês Anthony Burgess autor do livro A Laranja Mecânica publicado em 1962, que virou filme alguns anos depois, antecipou-se no vislumbre com a criação de personagens 'punks', alguns anos antes da aparição de qualquer coisa similar à inventada no livro. Mas logo a seguir começou um movimento de exploração comercial da onda toda, e assim nem todo mundo com um visual punk era realmente punk pra valer, muitos eram punks de boutique, clientes de lojas caras como as lojas da Senhora Vivienne Westwood, inicialmente a Let it Rock e depois a SEX, e também de muitas outras espalhadas por toda a cidade, e não mais apenas na Kings Road. Para concluir, confesso que passei a me interessar um pouco mais por aquelas tribos de gente esquisita e estranha, depois que conheci o som da banda de rock punk "The Clash", que tinha uma linha de pensamento muito ativista do ponto de vista político, frontalmente de esquerda radical e revolucionária. Fizeram inclusive um disco em homenagem à revolução sandinista da Nicarágua, com o disco de mesmo nome, mas nem todas as bandas punks navegavam nas mesmas águas do The Clash em termos políticos e ideológicos. Algumas outras bandas eram assumidamente anarquistas, mas nem todos os punks eram anarquistas, como leio de vez em quando em certos artigos por parte de jornalistas ditos culturais, isso porque grande parte, para não dizer a maioria se cadastravam em serviços do Estado para receber o cartão UB-40, que dava direito a receber semanalmente o seguro desemprego. E como sabemos, anarquista que se preza não se serve de nenhum serviço do Estado, seja ele qual for, isso na teoria, já que como se sabe, o anarquismo prega o fim e abolição completa do Estado, e por essa razão era incoerente ser anarquista e servir-se do amparo do Estado. Acho que ficou faltando ainda falar da questão do "No Future", e do "Do it yourself", muito comentado na mídia, mas nem sempre compreendida como deveria, que deixo para depois.


Para ouvir:

Um comentário:

  1. não esqueço uma noite que fui ao CBGB (onde foram lançados os sex pistols) no Bowery nova iorquino, que tédio, todos sentadinhos comportadamente fumando seu baseado. Que saudades senti de Salvador Ba.

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